sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Brasil em harmonia com a natureza




Com honras e pompas parte Cabral em março de 1500 de Portugal. El-rei D. Manuel falara-lhe de uma terra que, frente à África existirá a ocidente do Mar Oceano, que a descobrisse se pudesse. Bem sabia que o mundo é guerra e perfídia, mas coisas que o ódio nega, o temor as concede. Também sabia que há sinas e maldições a perseguir os fortes. Cabral tudo enfrenta, é homem de um só desígnio, antes quebrar que torcer.

Passado o domingo de Páscoa, nas ondas surgem ervas compridas, estará próxima a terra prometida? De manhã surgem
bandos de pássaros a voar para o ocidente, Vasco da Gama também dera conta deles. Ao meio da tarde, muito ao longe, avistam terra: um monte redondo e alto, com muito arvoredo na terra; ao monte chama de Pascoal e Vera Cruz dá nome à terra. Avançam até meia légua da terra, diretos à boca de um rio. Avista alguns homens pardos na praia, todos nus, sem nada que lhes cubra qualquer vergonha. Setas armadas e cordas tensas, chegam dispostos ao combate, mas a um sinal pousam seus arcos em terra. E o Capitão pergunta-se: que gente é esta que, até por gestos, aceita a mansidão? Ingenuidade ou malícia? Desconfia da ingenuidade e pensa: Será malícia?

O quebra-mar é forte e mal se entendem marinheiros e nativos, mas o Capitão lhes dá um sombreiro e recebe em troca um colar de conchinhas e um cocar de plumas vermelhas, talvez de papagaio. E com isto retorna à nau porque anoitece. Cabral ruma ao norte em busca de uma enseada para se abrigar, quando na praia repara que gesticulam uns 60 homens. O que estarão eles a conspirar?




Chegam a um lugar antes do por do sol e ali dá o nome de Porto Seguro. Seguindo recomendações, descem à terra
num esquife, mas que não se deixe apanhar desprevenido. O piloto que é homem destro, com muita amizade e gentileza consegue recolher dois daqueles mancebos que em terra corriam e, com muito prazer e festa, a bordo são recolhidos. Espantado continua o Capitão, o mundo é guerra e perfídia, como podem ser tão confiantes aqueles nativos? Alguma traição andam eles a tramar, a astúcia como escudo, a crueza como lança...

A feição deles é parda, à maneira de avermelhados, de bons rostos e narizes bem feitos. Andam nus sem nenhuma cobertura e estão acerca disso em tanta inocência como estão em mostrar o rosto. Trazem ambos os beiços furados e metidos por eles uns ossos brancos da grossura de um fuso de algodão. Os cabelos são corridos e andam tosquiados. Um traz na fronte uma cabeleira de penas de aves, que lhe cobre da testa às orelhas. Sobem à nau e não fazem menção de cortesia nem sequer ao Capitão. Mas um deles põe olho no colar de ouro que do pescoço traz pendurado ao peito e começa a acenar com a mão para terra e depois para o colar, como que a dizer que há ouro naquele lugar.


Cabral mostra um papagaio que trouxe de África. Os nativos logo o tomam e apontam para a costa, como a dizer que
aquela será terra de papagaios. Os navegantes mostram depois um carneiro e os nativos dele não fazem menção. Mostram-lhes uma galinha, ficam receosos e temem meter-lhe mão. A seguir, dão-lhes de comer pão, peixe cozido, mel, figos passados e vinho por uma taça. Não querem comer ou beber daquilo quase nada e alguma coisa, se a provam, logo a lançam fora. Dão-lhes água por uma botelha. Tomam dela o seu bocado, mas somente lavam as bocas e logo lançam fora. No convés, estiram-se de costas. O Capitão manda deitar-lhes um manto por cima e eles adormecem.

Será possível que possa haver mundo diverso daquele que o Capitão vive e conhece? Sem guerras, nem perfídia, nem traições? Será possível a fraternidade entre os homens e a comunhão dos seus interesses? Existe ainda na Terra o Paraíso que Adão e Eva perderam por malícia da Serpente?

Retornando à terra, muitos homens os cercam, falam e gritam, mas tudo com jeito de amizade. Algumas nativas
aparecem, gentis e de cabelos muito pretos e compridos. O capitão determina que se cante missa num ilhéu, e Cabral empunha a bandeira de Cristo. Muitos nativos se aproximam em suas canoas de troncos escavados. Alguns juntam-se aos navegantes tocando trombetas e buzinas, os restantes saltam e dançam o seu bocado.

Metem-se depois os navegantes terra adentro e junto a uma ribeira de muita água, encontram palmas não muito altas.
Colhem e comem bons palmitos. Então Diogo Dias, que era homem gracioso e de prazer, leva consigo um gaiteiro e mete-se a dançar com todo aquele povo, homens e mulheres, tomando-os pelas mãos, com o que eles folgam e riem muito ao som da gaita. Não há vestígio nem de guerra, nem de traição, nem de perfídia, nem sequer de receio. Já vacila o Capitão na sua desconfiança.

Junto à cruz todos se ajoelham, beijam a cruz e os nativos os acompanham e assim o fazem. Ao Capitão lhe parece que
aquela gente de tal inocência, se fosse possível entendê-los e fazer-se entender, logo seriam cristãos. Não têm crença alguma, ao que parecia. Os degredados que ali ficariam, aprenderiam sua fala e não duvida que logo se tornariam cristãos, porque era gente boa e simples. E Cabral crê que não foi sem causa, que Nosso Senhor lhe enviou àquela terra de homens com bons corpos e bons rostos, como de bons homens.

E já chegando o mês de Maio, iam os navegantes rio abaixo com os sacerdotes cantando em jeito de procissão. Metem-se 70 ou 80
nativos a ajudar no transporte da cruz, e quando já na praia Frei Henrique canta a missa, todos eles se ajoelham como os portugueses, seguindo-lhes os gestos. Já achou o Capitão-mor que a inocência desta gente é tal, que a de Adão não seria maior. Esta terra será imensa, dela não se vê o fim, de ponta a ponta é toda praia formosa.

E os arvoredos com muitas aves coloridas, correm para dentro a perder de vista. Alguns dos paus são de madeira
avermelhada, cor de brasa; os ares são muito bons e temperados e as fontes são infindas. E escreve Cabral: Dessa terra querendo-a aproveitar, nela tudo se dá, por bem das águas que tem. Mas o melhor fruto, a principal semente, é este povo que aqui vive em estado natural sob um céu azul anil. E por sua bela natureza, de um povo tão gentil, essa terra será chamada Brasil...

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Quem sou

Nascida em Belo Horizonte, apaixonada pela vida urbana, sou fascinada pelo meu tempo e pelo passado histórico, dois contrastes que exploro para entender o futuro. Tranquila com a vida e insatisfeita com as convenções, procuro conhecer gente e culturas, para trazer de uma viagem, além de fotos e recordações, o que aprendo durante a caminhada. E o que mais engradece um caminhante é saber que ao compartilhar seu conhecimento, possa tornar o mundo melhor.

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